quinta-feira, dezembro 29, 2005

Contemplações dos cantinhos da memória de Lisboa!

A alegoria paternalista.
Há quem viva.
Há quem saiba.
Não há muitos que saibam o que vivem.
Muito menos ainda há os que vivam o que sabem, que é como quem diz os que vivem como pensam! Porque a vida neste hemisfério da demohipocrisia só é acessível aos que vivem a igualdade entre os que melhor se adaptam à plástica evidência do arroto mental, a feder a cerveja ou a "vodkashot" das tribunas em que se idolatrizam as fantasias da nova religiosidade enebriante, com inspirações voodoo q.b., de tendências pseudo-demoníacas com substracto cartimante, mezinhas fétiches e objectivos neo-kafkianos. E não falemos de "missas negras", ou dos que, entretanto, se abichanam com mais ou menos pudor, consoante já tenham ou não estatuto de digno militante bloquista, com charros e abortos para sobremesa! Quanto a ensinar aos pequeninos, nas suas escolas, o que quer dizer prazer sexual ... isso já nem merece conversa!
O que vos digo, é que há por aí gente que já enoja! A quem se tem dado muito espaço vital, quando são gente sem o mínimo respeito por aquilo que significa vida. Sobretudo quando se trata da vida dos outros, que é como quem diz da vida daqueles que têm a coragem de dizer que não pensam como eles, e que vivem segundo aquilo que pensam, não como aqueles que vivem segundo aquilo que lhes dizem para pensar! Essa é a postura dos que consomem produtos fast; vestem roupa de marca transnacional; não sabem o que é ter de ir ao galinheiro meter o dedo no cú da galinha para ver se tem ovo; nunca tiveram mãe ou mulher que abortasse; raramente se aperceberam do que é ter de trabalhar como escravo; nunca se mostraram humildes, porque isso, para eles, é atitude de fraco alienado; não toleram o que lhes é estranho, porque isso é próprio dos hipócritas que não querem ver a "realidade"; ... enfim, essa é a postura dos que rejeitam o que a vida nunca lhes ensinou, porque nunca tiveram a coragem de assumir que todos os seres humanos são feitos de erros e de virtudes! Não apenas de um ou de outro destes dois atributos, mas de um equilíbrio subjectivamene desenvolvido entre os dois, em que cada indivíduo constrói o seu activo e o seu passivo social! Sobretudo os que, conscientemente, assim aprendem o que é meu e o que é dos outros, para não estar constantemente a dizer que o que pensa é, obrigatoriamente, o que os outros devem pensar! Não! Ser cidadão é ser "eu" no meio dos "outros" que poderão, comigo, ser socialmente um "nós", o que todos devemos ser, que é como quem diz, democraticamente, uma polis.
Por isso pode ser preferível a genuína pecepção de uma criança, cujo olhar crítico raramente nos decepciona! E muito menos se atreve a enganar, empenhando-se em tentar que quem as escute ou observe se digne, apenas, a agir da mesma maneira! Essa constante sede de igualdade pessoal é a mais infantil exigência de quem começa a pecepcionar um mundo feito com os outros, e que mais tarde se transformará num "nós" mais ou menos social (nas complexas contingências da socialização)! Sem discriminar: seja com o parceiro, irmão, pai ou mãe! O que, para quem se encontra numa destas condições, significará a necessidade de se aperceber de quanto tem de corresponder àquelas exigências naturais. Quando assim não acontece, há pais que rejeitam filhos, filhos que rejeitam pais, irmãos que não sabem quem é o outro irmão, pessoas que não sabem o que é ser "as outras pessoas"!
Aos meus queridos filhos, a todos, espero ter sempre conseguido fazer ver que eu, e vós, e todos os outros, constituimos um "nós" no qual, inevitavelmente, todos somos, e assim continuaremos a ser enquanto formos "todos" feitos de "eus" que somos "nós"!!!
Um Pai mais esclarecido!

sexta-feira, dezembro 23, 2005

Cogitando

Liberdade, agora, só no exílio! "Por favor, onde fica o exílio?", é expressão já muito corrente do desagrado ou pelo desespero em último grau da tolerância psicossomática, ou de como o nosso corpo já não consegue suportar as violentas agressões dos intolerantes da déspota demagogia, vestida ou trajada a rigor em pseudo-democratas gerontocráticos e respectivas descendências (afiliadas ou sanguíneas), acossados de múltiplas cumplicidades secretamente cartorizadas por alguns dos que com eles não ficaram porque tiveram, mesmo nessa linha, o decente aprumo da assunção pública de tão claros desvios! E depois falam como se fossem os verdadeiros arautos da liberdade. Quanto não teremos todos de trabalhar para, ainda, termos uma réstia de esperança em voltar a vivê-la! Com esta gente não se pode viver o sossego da paz de espírito, o à vontade das consciências tranquilas, nem muito menos a liberdade de expressão que, eventualmente, os moleste! Eles insistem e, por isso, persistem no sistema que tão enigmática e ardilosamente engenharam, para o contínuo repasto que, sistematicamente, nos é nefasto! Mas, … enfim … a persistência não se dá apenas à virtude, assim como esta também não apadrinha o vício ou a desfaçatez de quem se agarra a ela para dizer que é só sua, em jeito de cerimonial expressão de ciúme por quem naturalmente a evidencia, estando por isso constantemente à mercê das investidas da besta, com ou sem bestial "show" de blasfémias! É de bradar aos céus, a ligeireza com que tão vil figura, como a que faz o candidato presidencial do Partido Socialista, arrola as mais impróprias e inoportunas adjectivações aos que se lhe deparam pela frente, em justa, leal e pública competição! Nisso não perdeu o jeito, que é como quem diz tecer contradições apenas com afirmações que ninguém ousa contestar. Já vimos isso quando enfrentou, em manifesta desvantagem eleitoral, Freitas do Amaral, autenticamente rapinado pelas garras do “milhafre”! Mas também vimos estes dias que, sendo o ex-PM Cavaco tão mau quanto Soares o pinta, Sampaio teve muito menos razão para acabar com o governo de Santana do que Soares para com Cavaco! Por que não o fez? Agora, que ele se descobre a si mesmo, é que vem dizer que “o Presidente da República não governa”! Aquele senhor (se é que o é, porque tenho as minhas sérias dúvidas desde que o vi a tremer aquando de um também muito televisionado debate a dois, com o Dr. Basílio Horta, em que este quase o levou ao "brake down", cuja cumplicidade assim denunciada quase o obrigou a degenerar certamente numa histérica evocação da "valha-nos Deus a república, que eu até sendo ateu, com Ele também negoceio, e por isso o senhor veja lá como é que fala comigo...") está mentalmente esclerótico, politicamente amorfo, filosoficamente necrótico, humanamente depenante! É mesmo de meter pena, tal é o estado ridículo do coitado! Pobreza posta, cruelmente, a nú, pela sua própria irreverência! Agora, talvez já nem esta República o valha, tal é a inutilidade política dos impropérios com que a presenteia, em tempos de provável intolerância dos que, agora, ocupam as cadeiras dos lugares onde já muitas vezes, democraticamente, o sentaram! Nem a santa liberdade nos acudará, se o eleitorado ainda não acordou para a realidade (há sempre essa possibilidade, pelo menos teórica), pois de nada nos servirá em tempos de vacas tão magras, tão magras, que ninguém calará esse pretenso pseudo monarca das tolerâncias do "faz de conta" e das "presidências abertas" que inaugurou hipocritamente, chegando mesmo a "dormir como um rei" no Paço dos Duques de Bragança da Cidade berço da nacionalidade. Só que ainda não foi daquela que conseguiu lá encontrar aquilo que nem os maçons que o acoitam alguma vez conseguiram. Mesmo no sítio onde a nossa liberdade como nação começou, há uns bons anos transformado num feudo socialista, mas que respeitosamente não responde, quando se trata de prestar vassalagem a quem nunca soube o que poderá ser ser-se rei.

Um português angustiado.

sábado, dezembro 03, 2005

O ano da nossa (des) constitucionalidade

Da Polis

Professor J. Rodrigo Coelho Os Homens, os Factos e as Ideias (a análise e o discurso que vivemos) E por que é ‘tempo’ de presidenciais, merecem destaque dois dos grandes atentados à Lei Fundamental com que, provavelmente, ficará colmatada a melancólica presidencialização de dez anos sampaiistas.
1. Uma dessas ofensas (por acção) à nossa Lei Fundamental consistiu, em nosso entender, no enigmático acto de, por sua própria iniciativa, o PR dissolver a AR sem fundamentação jurídico-constitucional: à luz da nossa CRP, não existiu qualquer situação relacionada com os pressupostos previstos na alínea e) do seu artº 134, não sendo “evidente o alcance do poder do PR de se pronunciar sobre as emergências graves para a vida da República… um conceito vago como é o de emergências graves para a vida da República suscita grandes dificuldades … existe, porém, uma larga margem de discricionariedade política do PR, quer para decidir quanto à existência de «emergências graves» que justifiquem pronunciar-se para individualizar os pressupostos objectivos da sua tomada de posição (problemas de anormalidade constitucional, situações económicas excepcionais, etc.), quer para escolher o momento e a forma de se pronunciar” [i]; nem nenhuma das situações previstas nos dois números do artº 195º, pelo que convém salientar que a dissolução da AR “tem lugar, quase sempre, justamente para possibilitar novas soluções de governo”. É que há “claramente um nexo orgânico necessário entre o Governo e a AR à sombra da qual foi constituído, pelo que a renovação da AR implica necessariamente a substituição do governo” [ii]. Entendemos, por isso, que possam ter estado na origem do tal acto discricionário as vantagens dos imperativos decorrentes da articulação automática dos preceitos orgânico-constitucionais, enquadrando politicamente a “mira” do PR, já que “a dissolução da AR é um acto da exclusiva competência do PR. Não depende de proposta de qualquer outro órgão, nem de autorização ou parecer favorável, já que o parecer do Conselho de Estado não é vinculativo. Finalmente, o acto de dissolução não está ligado a nenhum pressuposto objectivo (crise governamental, por exemplo). O PR goza assim de uma grande margem de liberdade na dissolução da AR, sendo este um dos traços característicos do sistema do Governo. De resto, … a dissolução da AR transforma-se no principal instrumento de intervenção institucional do PR” [iii]. Mas este seu poder-dever de intervenção não pode invadir a esfera estritamente governativa, pois “a função de governo ou de direcção política pertence principalmente ao Governo (artº 182º)”, apesar da responsabilidade política do PM e do Governo perante aquele (artºs 190º e 191, nº 1), e mais ainda, “os Ministros não são individualmente responsáveis perante o PR (artº 191, nº 2)” [iv], quadro de expectativas que conformam o que, através dos órgãos da comunicação social, ficou interiorizado na mente da opinião pública em geral. Mantendo a fidelidade científico-conceptual ao meu mui citado mestre J.A. Maltez, aproveito a oportunidade de uma das suas alusões a esta temática, quando metaforicamente declara: ”Afinal, continuamos a preferir o decretino nomeativo à velha justiça da igualdade de oportunidades e não parece que sejamos capaz de decepar o atavismo inquisitorial das irresponsáveis denunciações de ouvida que, ainda no século XX, se reanimaram com a versão ministerialista da bufaria pidesca. “ [v] 2. A segunda ofensa pode configurar-se, politicamente, na instrumentalização político-partidária do PR. Admitindo a seriedade da sua posição perante as medidas governativas que promovem a desigualdade profissional a partir da ofensa a direitos constitucionais adquiridos (estamos a referir-nos, por exemplo, ao diploma, obra do actual Governo, em que se dispõe sobre o congelamento das progressões nas carreiras profissionais), dificilmente esta outra ofensa (por omissão) poderá escapar aos olhos da suspeição pública, promulgando aquele diploma de iniciativa governamental, merecedor de todos os tipos de fiscalização da constitucionalidade (o que constituiu o mesmo que um não-veto político presidencial, ou seja, omissão superveniente do não uso, quando devido, desse poder constitucional que é o veto político ─ interpretação que entendemos seguir a linha de raciocínio de G. Canotilho e V. Moreira, quando afirmam que “a promulgação … apresenta uma dupla dimensão: (a) garante a autenticidade do diploma…; (b) exprime e pressupõe o direito de controlo (controlo material) exercido pelo PR. O controlo exercido é, por um lado, um controlo de defesa da Constituição, pois, de acordo com o princípio da prevalência da Constituição (cfr. art. 3º), o PR tem o dever, como órgão constitucional, de não colaborar no procedimento de formação de um acto do Estado contrário à Lei Fundamental; por outro lado, o controlo é um controlo político autónomo, próprio de um órgão constitucional de um sistema misto parlamentar-presidencial, ao qual são conferidos poderes de conformação política. O primeiro tipo de controlo manifesta-se sobretudo através do veto por inconstitucionalidade (cfr. art. 279º); o segundo está sobretudo ligado ao chamado veto político (…) o veto presidencial é distinto da sanção do período monárquico: a sanção era a manifestação da contitularidade, pelo monarca, da função legislativa; o veto é a manifestação dos poderes de controlo constitucional e de conformação política de um presidente republicano, num sistema misto. (…) o direito de veto e a fiscalização preventiva da constitucionalidade … são coincidentes no caso das leis e decretos-leis)” [vi]. [i] CANOTILHO, J. J. Gomes, MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa (Anotada), 2ª edição revista ampliada, 2º volume, Coimbra Editora, 1985, pp. 127-128. [ii] Idem, pág. 286. [iii] Idem, pág. 226. [iv] Idem, pág. 28. [v] www.tempoquepassa.blogspot.com, Outubro de 2005. [vi] Idem, ob. Cit., pp. 132-134.